É evidente para quem acompanha a trajetória do Coletivo Dolores que somos avessos às premiações como instrumento de eleição dos "melhores". Este mecanismo, além de naturalizar hierarquias e competições, faz com que determinados grupos detenham o poder de decidir o que é ou não é arte.
Atualmente, em nosso país, o fazer cultural é dominado por grandes empresas privadas que, baseadas em critérios falsamente neutros e na força do dinheiro, ditam qual filme devemos ver, qual música devemos escutar, qual peça teatral devemos assistir. O financiamento privado exclui e, até mesmo, inviabiliza o fazer artístico que não se enquadre em seus critérios, sejam eles estéticos ou mercadológicos.
A liberdade de expressão, tão amplamente defendida, é restringida quando meia dúzia de financiadores domina a produção cultural. Muitas vezes, esses financiadores privados se utilizam de dinheiro público por meio de isenções fiscais e ainda se beneficiam do marketing propiciado. Esta engrenagem é viabilizada pela Lei Rouanet, à qual nós e inúmeros outros coletivos artísticos frontalmente nos opomos.
Também não deixa de ser tristemente irônico que uma das premiações mais conceituadas no meio artístico seja patrocinada por uma empresa que participa ativamente da lógica de produção de ditaduras perenes, guerras e golpes de Estado. Assim sendo, publicamente nos irmanamos a todas as lutas de emancipação de povos que possuem a riqueza do petróleo, mas que não podem usufruir deste recurso devido à ingerência de potências militares em seu território e à presença de empresas petrolíferas nacionais e transnacionais que usurpam essa riqueza.
Aproveitamos para declarar publicamente que aceitamos o prêmio. Em nosso entendimento, esta é uma forma de restituição de uma ínfima parte do dinheiro expropriado da classe trabalhadora. Recebemos o que é nosso (enquanto classe, no sentido marxista) e debateremos um fim público para esta verba.